UMA BREVE APRESENTAÇÃO SOBRE ESPECTROSCOPIA
Por: Asaf Ribas
Espectroscopia, o que significa? Qual sua utilidade? Quais os métodos utilizados? essas e outras questões nos vem à memória quando lemos essa palavra. Nesse esboço abordaremos alguns dos métodos de espectroscopia existentes, e também suas características, pré requisitos e contribuições para ciência.
ORIGEM E CARACTERÍSTICAS
A espectroscopia teve sua origem no século XIX tendo como característica o estudo dos fenômenos físicos e químicos, como por exemplo a alteração nos níveis de energia de átomos ou moléculas. Ela estuda também o fenômeno de refração, que é responsável por modificar a velocidade de propagação e comprimento da onda, mantendo uma proporção direta. Outros fenômenos analisados são: reflexão; interferência; difração e espalhamento elástico. E não é só isso, a espectroscopia consiste em ser uma variedade de técnicas que utiliza radiação com o intuito de colher dados sobre a estrutura e propriedades da matéria.
As palavras “espectron” e “skopein” dão origem ao termo, sendo elas latina e grega de forma respectiva, a primeira significa espírito e/ou fantasma enquanto a segunda significa olhar para o mundo ou simplesmente ver. A utilidade da espectroscopia é algo fantástico e de suma importância, pois ela nos permite entender exatamente o que acontece com a matéria após a interação da mesma com a luz, a partir daí podemos de forma qualitativa determinar informações sobre a amostra analisada.
A utilização de lasers é indispensável na espectroscopia, especialmente pelas suas propriedades espectrais, pois possuem alta intensidade e são definidos com alta precisão. Um laser lança fótons com uma energia definida para excitar um material que o absorve, como consequência o nível de energia de um elétron pode ser elevado. Um exemplo prático, são as transições a partir do estado fundamental (background). As figuras 01 e 02 tentam explicar graficamente esse comportamento.
Figura 01: Interação laser e elétron. Obs: fora de escala.
Figura 02: Interação laser e elétron. Mudança de nível energético (de estado). Obs: fora de escala.
ESPECTROSCOPIA RAMAN (EFEITO RAMAN)
O efeito Raman foi previsto teoricamente por Smekal em (1923), e descoberto experimentalmente por Raman (1928). Essa técnica trouxe grande curiosidade entre os físicos da época, os mesmos tentavam determinar seu mecanismo, explicar de alguma maneira, mas em (1934) viria a ser publicado o estudo fundamental sobre a teoria do efeito Raman, de autoria do doutor em Física, Placzek. Nessa época os trabalhos experimentais eram limitados, pois as fontes de excitação tinham deficiências. Mas teve uma técnica de excitação que se destacou e conseguiu realizar excitações de maneira rotineira, a mesma foi desenvolvida no laboratório da Universidade de São Paulo, essa fonte utilizava descarga em hélio em uma lâmpada em formato helicoidal, e foi desenvolvida por Stammreich e seus colaboradores. Com o surgimento dos lasers a excitação passou a ser mais precisa, em (1962) Porto & Wood utilizaram laser pulsado de rubi pela primeira vez na espectroscopia Raman.
A espectroscopia Raman (RS) permite a identificação da estrutura Química do material analisado em poucos segundos, sendo o material orgânico ou inorgânico, as informações são obtidas através do espalhamento de luz, que é provocado pela interação da matéria com a radiação eletromagnética [02].
No momento em que os fótons de luz atingem o material estudado, podem ocorrer espalhamento dessa luz, uma maneira dessa luz espalhar é denominado Rayleigh o qual não é tão interessante, pois esse espalhamento é elástico, ou seja há conservação de energia de início ao fim do experimento, no entanto a luz pode ser espalhada de outra maneira a qual é interessante estudarmos, chamada Raman, ou espalhamento inelástico, dá-se esta caracterização quando a energia do fóton sofre ligeira alteração após ser espalhado, podendo ter ganho ou perda da energia [02]. Esta diferença de energia está relacionada à energia com que os átomos atingidos pela radiação estão vibrando, e é esta frequência de vibração que permite a identificação de como os átomos estão ligados, fornecendo informação sobre a geometria molecular do material.
Como resultado, o espalhamento inelástico de luz pode ocorrer tanto em um fóton de menor energia, quanto em um fóton de maior energia [02, 03,]. No primeiro caso, o fóton incidente encontra a molécula em um estado vibracional fundamental e o fóton espalhado a deixa em um estado vibracionalmente excitado a diferença de energia entre o fóton incidente e o espalhado corresponde, portanto, à energia necessária para excitar esse nível vibracional. O mesmo acontece caso o fóton espalhado tenha maior energia que o fóton incidente devido à distribuição de Boltzman, existe um número finito de moléculas que, nas condições ambientes, já estão vibracionalmente excitadas e quando a molécula retorna ao estado fundamental a partir de um estado virtual, um fóton com maior energia do que o fóton incidente é criado.
Espalhamento inelástico Raman Stokes, quando a luz espalhada tem energia menor que a luz incidente significa que a molécula estava no estado fundamental, recebeu a luz incidente e foi excitada, quando voltou ao estado eletrônico fundamental ela absorveu parte dessa energia e ficou em um estado vibracional excitado (Figura04.b).
Espalhamento inelástico Raman Anti-Stokes, Quando a luz espalhada é maior (de maior energia - comprimento de onda diferente) que a incidente significa que a molécula estava já em um nível vibracional excitado (pela distribuição de Boltzman é menor o número de moléculas assim e diminui a cada nível mais alto), que ao receber a luz incidente vai para um nível mais alto virtual ou eletrônico e quando a molécula volta, ela volta ao estado fundamental, eletrônico e vibracional. A energia do feixe se soma a diferença de energia do estado em que a molécula estava e o fundamental (onde a molécula terminou) e este sai com energia maior (Figura04.c).
Espalhamento elástico Rayleigh, Quando a luz espalhada é igual a incidente a molécula foi excitada e voltou ao estado fundamental, ou o estado onde ela se encontrava no início, não houve perda de energia (Figura04.a).
Figura 4: Espalhamento de luz: Espalhamento elástico (Região Rayleigh) , Espalhamento inelástico (Região Stokes); Espalhamento inelástico (Região Anti-Stokes). Fonte: https://www.pngwing.com/pt/free-png-yuoqf
ESPECTROSCOPIA NO INFRAVERMELHO
A espectroscopia na região do Infravermelho (IR: Infrared) é uma técnica de espectroscopia vibracional baseada em absorção molecular em que a energia, quando absorvida por uma determinada molécula, promove transições vibracionais e rotacionais. Essa região espectral pode ser subdividida em três: (Figura 5), infravermelho próximo, NIR (NIR: Near Infrared), infravermelho médio, MIR (MIR: Middle Infrared), e distante (FAR: Far Infrared) que estão contidas na faixa de 12800-10 cm-1 (SKOOG; HOLLER; CROUCH, 2009). A grande vantagem da espectroscopia na região do IR reside no fato de que essa técnica analítica é extremamente versátil, capaz de analisar amostras nos três estados da matéria (gasoso, líquido e sólido) com o mínimo (ou nenhum) preparo de amostra.
Figura 5: Espectro eletromagnético. Em destaque a região do visível ao Infravermelho (ESKILDSEN, 2016).
A espectroscopia no infravermelho se baseia no fato de que as ligações químicas das substâncias possuem frequências de vibração específicas, as quais correspondem a níveis de energia da molécula também chamados nesse caso de níveis vibracionais. Tais frequências dependem da forma da superfície de energia potencial da molécula, da geometria molecular, das massas dos átomos e eventualmente do acoplamento vibrónico.
Se a molécula receber radiação eletromagnética com exatamente a mesma energia de uma dessas vibrações, então a luz será absorvida, desde que sejam atendidas determinadas condições. Para que ocorra a vibração da ligação química e esta apareça no espectro IV, a molécula precisa sofrer uma variação no seu momento dipolar devido a essa vibração. As ligações podem vibrar de seis modos: estiramento simétrico, estiramento assimétrico, tesoura, torção (twist), balanço (wag) e rotação.
Figura 6: Movimentos de estiramento e deformações moleculares que são ativos no IR. Adaptado de SKOOG, 2009).
APLICAÇÕES
O campo de aplicabilidade da espectroscopia Raman e Infravermelho abrange desde estudos de pigmentos em obras de arte, arqueologia, química [07], física [12], biologia, até aplicações forenses. A espectroscopia Raman também tem um importante papel no estudo de materiais no campo da nanotecnologia, sendo que esta técnica não destrutiva e geralmente rápida é amplamente utilizada no estudo de nanomateriais baseados em carbono como grafeno [04], nanotubos [05] e fulerenos [06].
REFERÊNCIAS
[01] MEŠTROVIĆ, Tomislav. O que é espectroscopia. News medical life sciences. Disponível em: <What is Spectroscopy?>
[02] LACAPC, Laboratório de Arqueometria e Ciências Aplicadas ao Patrimônio Cultural do IFUSP. Espectroscopia Raman. Disponível em: https://portal.if.usp.br/arqueometria/pt-br/node/347
[03] FARIA, D. L. A. de, Santos, L. G. C. e Gonçalves, N. S.Uma Demonstração Sobre o Espalhamento Inelástico de Luz: Repetindo o Experimento de Raman. Química Nova [online]. 1997, v. 20, n. 3 [Acessado 25 Outubro 2021], pp. 319-323. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0100-40421997000300014>.
[04] HAACK, M.S; Larrude, D.G; Ferreira, C.A. Aplicação da Espectroscopia Raman na caracterização de grafeno e compostos derivados. 57º Congresso Brasileiro Química. 2017. [Acessado em 25 de outubro 2021]. Disponível em: http://www.abq.org.br/cbq/2017/trabalhos/12/11689-25092.html
[05] PIRES, R.; GUSTAVO HARDT ALVES VIEIRA, L.; ALVES CAMPANELLI, D.; WAGNER MACIEL KAEHLER, J.; ENRIQUE GOMEZ ARMAS, L. CONSTRUÇÃO/APLICAÇÃO DE UM DISPOSITIVO DE TEMPERATURA NOS ESPECTROS RAMAN DE NITRETO DE BORO HEXAGONAL. Anais do Salão Internacional de Ensino, Pesquisa e Extensão, v. 11, n. 2, 28 ago. 2020. Acessado em 25 de outubro 2021. Disponível em: https://periodicos.unipampa.edu.br/index.php/SIEPE/article/view/104379
[06] RONCASELLI, Lucas Kaique Martins. Estudo e caracterização de filmes nanoestrurados de derivados de poli-fulerenos. Repositório Institucional Unesp 30 de abril 2021. Acessado em 25 Outubro 2021. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/210978
[07] SANTOS, Adriele. APLICAÇÃO DA ESPECTROSCOPIA RAMAN NA CARACTERIZAÇÃO DE MINERAIS PERTENCENTES A UMA GEOCOLEÇÃO. Química Nova [online]. 2019, v. 42, n. 5 [Acessado 25 Outubro 2021] , pp. 489-496. Disponível em: <https://doi.org/10.21577/0100-4042.20170358>.
[08] CALDAS, da Cruz Flávio. GLA Grupo de Lasers e Aplicações. Intituto de Física Unicamp. Disponível em: <https://portal.ifi.unicamp.br/a-instituicao/departamentos/deq-departamento-de-eletronica-quantica/grupo-de-lasers-e-aplicacoes-gla>
[09] BRAGA, Rafael. Espectroscopia o que é? Definições princípios e aplicações. Conhecimento científico. Acessado em 25 Outubro 2021. Disponível em: https://conhecimentocientifico.com/espectroscopia/
[10] FILGUEIRAS, A.L. Carlos. A espectroscopia e a química da descoberta de novos elementos ao limiar da teoria quântica. Química nova na escola. Acessadi em 25 Otubro 2021. Disponível em: http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc03/historia.pdf
[11] SOUTO, Ana Lucia. O espectro eletromagnético. Khan Academy. Acessado em 25 Otubro 2021. Disponível em: https://pt.khanacademy.org/science/9-ano/materia-e-energia-as-ondas/ondas-eletromagneticas/a/o-espectro-eletromagnetico
[12] Q.S. Martins, P.V. Almeida, Q.S. Ferreira, A. Oliveira, C. Aguirre, J.L.B. Faria, Investigation of ostrich oil via Raman and infrared spectroscopy and predictions using the DFT method, Vibrational Spectroscopy, Volume 104, 2019, 102945, ISSN 0924-2031. Acessado em 25 de outubro 2021. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.vibspec.2019.102945